A questão da técnica em Gestalt-Terapia vem sendo discutida ao
longo dos últimos anos em um progressivo deslocamento de foco das técnicas em
si, e seus poderosos resultados, para seu uso segundo uma postura fenomenológica
e dialógica.
Historicamente, a Gestalt-Terapia ficou bastante conhecida por
suas técnicas quase "mágicas", o que nos deixou herdeiros de uma série
de mal entendidos acerca de sua fundamentação, gerando até hoje, uma prática
mal fundamentada e, muitas vezes, baseada na "intuição" e no
"achismo".
Portanto, temos o objetivo de esclarecer o lugar da técnica no
trabalho do gestalt-terapeuta e a quais critérios ela encontra-se submetida.
Para começar, é importante ressaltar que vamos
chamar de técnica aquilo que podemos “fazer com isso”, para mobilizar
“aquilo”. Assim, quando falamos de desenho, por exemplo, não estamos nos
referindo a uma técnica mas a uma atividade realizada com alguns recursos
lúdicos, que poderia inclusive ser realizada em muitos outros ambientes
freqüentados pela criança além do espaço terapêutico.
O caráter terapêutico dessa atividade será dado pelo uso da técnica a partir do que foi produzido, como por exemplo, um pedido de descrição de um desenho realizado pela criança
na sessão. Sob esse ponto de vista, cada psicoterapeuta, a partir de sua
abordagem de trabalho e da sua metodologia, pode utilizar uma determinada técnica para trabalhar
o mesmo desenho.
Também é importante não confundirmos técnica com recursos
lúdicos: a argila, por
exemplo, não é uma técnica , mas um recurso que pode ser utilizado de diversas
formas pela criança; a
técnica incidirá naquilo que a criança
produziu com a argila ou na forma
como ela conduziu sua manipulação do material.
Sob o ponto de vista fenomenológico da Gestalt-Terapia, a
técnica serve para facilitar,
fomentar, fazer emergir e desenvolver o material oferecido a partir do que a criança escolhe realizar na sessão. Ela pode ser
apresentada na forma de
descrições, questionamentos ou de experimentos.
Poderá incidir sobre a linguagem
verbal da criança, sobre seu comportamento total na sessão terapêutica, sobre sua relação com o psicoterapeuta ou ainda sobre sua relação com os responsáveis. A
técnica incidirá sempre sobre o conteúdo e/ou sobre as formas de evitação do que emerge na sessão
terapêutica em um ininterrupto movimento de figura e fundo.
A alternância de intervenções entre forma e conteúdo é
característica dos processos terapêuticos de caráter holístico, uma vez que o
ser humano dentro dessa perspectiva não pode ser compreendido apenas por aquilo
que ele fala, mas a partir de seu comportamento total no campo terapêutico.
Dessa forma, ainda que possamos estar
munidos de uma variedade de técnicas, sua forma de utilização, bem como o
contexto em que serão utilizadas precisam estar em consonância com nossa
metodologia fenomenológica e inseridas dentro de uma perspectiva de relação
terapêutica dialógica.
Isto significa que jamais utilizaremos uma técnica que não surja
a partir da situação apresentada pela criança e que não seja possível dentro da
fronteira relacional criança-psicoterapeuta em um dado momento do processo
terapêutico.
Ao utilizarmos uma técnica dentro desses parâmetros,
necessariamente nos encontraremos em condições de afirmar para quê a estamos usando naquele momento, ou
seja, apresentaremos condições de argumentar teoricamente o seu uso. Saber o
que estamos fazendo é fundamental!!
É importante ressaltar que saber para que estamos usando aquela técnica com aquela criança e não outra técnica qualquer, não significa prever ou saber de antemão os desdobramentos de seu uso; uma vez
que trabalhamos com seres humanos singulares, jamais poderemos prever aquilo
que vai acontecer exatamente a partir da mobilização promovida por uma técnica,
mas podemos e devemos saber aquilo que queremos mobilizar, frustrar ou confirmar.
Da mesma forma, a técnica precisa responder as necessidades e
limites da criança em questão, porque aquela que se revela uma técnica
excelente para uma criança específica pode ser um desastre ou não fazer nenhum
tipo de sentido com outra criança. Costumamos usar para isso a metáfora da
ferramenta: não adianta usarmos um alicate, que é uma excelente ferramenta, em
situações que demandam uma chave de fenda. Assim, além de possuirmos as
técnicas, precisamos saber utiliza-las.
Acreditamos que, para saber utiliza-las, precisamos
paradoxalmente, esquece-las, deixa-las no fundo, de forma que possam emergir
criativamente nos contextos em que sua presença se fizer necessária para que
psicoterapeuta e criança continuem caminhando juntos na direção da expansão das
fronteiras da criança. E para que possamos esquecer-nos delas, precisamos
estuda-las, pratica-las e, sobretudo, experimenta-las. A familiaridade do
psicoterapeuta não só com as técnicas quanto com os recursos lúdicos é de
fundamental importância para a fluidez do seu trabalho que vai se assemelhar a
uma dança improvisada, porém realizada com passos seguros e bem formados.
Entramos então na
necessidade já mencionada em outras postagens, de uma sólida formação do
gestalt-terapeuta de crianças e que inclua necessariamente a possibilidade de
vivenciar uma gama significativa de técnicas e seus desdobramentos,
utilizando-se de uma diversidade de recursos lúdicos.
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirEste comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluir