A PROPOSTA DA GESTALT-TERAPIA COM CRIANÇAS
A criança sob a
ótica da Gestalt-terapia é vista como uma totalidade singular, que se
desenvolve através da relação ativa e sucessiva com as forças do campo do qual
é parte integrante e só pode ser entendida a partir desse contexto de forças
que se intercruzam e interagem, o que significa considerar uma inevitável
vinculação entre fatores emocionais, cognitivos, orgânicos, comportamentais,
sociais, históricos e culturais.
Ao longo de seu
desenvolvimento, apesar de a criança ser a todo instante influenciada e
modificada, ela também detém a possibilidade de influenciar e transformar seu
meio com a finalidade de torná-lo assimilável, caracterizando assim, o
desenvolvimento como um processo ininterrupto de interação com o mundo.
É nessa interação
que o ser humano, com suas potencialidades, se diferencia, se desenvolve e se
torna uma pessoa com características próprias. Assim, a relação estabelecida
com o mundo não se caracteriza pela passividade, mas pela possibilidade –
guardada as devidas proporções determinadas pelos recursos maturacionais da
criança por um lado e pela permissividade do meio, por outro lado – de ação e
transformação do meio com a finalidade de adaptar-se da melhor forma possível
as circunstâncias, o que denominamos de ajustamento criativo.
Dessa forma,
concluímos que, dentro de uma perspectiva gestáltica, o desenvolvimento do ser
humano é um processo contínuo de ajustamentos criativos, o que significa que
estamos em constante transformação e a cada momento nos apresentamos com uma
configuração única, com infinitas possibilidades de novas reconfigurações e
assim por diante de forma ininterrupta até o final da vida.
Com essa visão de
ser humano, o que vamos denominar infância é na verdade, um determinado período
desse desenvolvimento que nunca termina, onde o ritmo das aquisições e
transformações é mais acelerado, fazendo desse período palco de constantes
desafios e inúmeros ajustamentos criativos.
É importante
ressaltar que a criança não é vista como um ser inacabado, imaturo ou
imperfeito em contraposição a um individuo adulto maduro, desenvolvido,
acabado. O desenvolvimento humano não é visto como uma história de fases rumo a
um objetivo final, mas como um percurso construído a partir de momentos
singulares sucessivos que são em si acabados e maduros no aqui e agora.
Atuar junto a
essa criança, significa utilizar o arcabouço teórico e técnico da
Gestalt-terapia no sentido de, por um lado, facilitar o pleno desenvolvimento
de seu potencial e, por outro promover as necessárias reconfigurações de
padrões estereotipados e cristalizados que caracterizam o funcionamento não
saudável.
Assinalamos dessa
forma, um caráter não só “curativo” ou de trabalho com aquilo que não se
apresenta saudável, mas também uma perspectiva de prevenção do funcionamento
não saudável através da promoção do funcionamento saudável.
Promover o
funcionamento saudável significa poder encontrar essa criança antes que ela
chegue em nossos consultórios, significa encontra-la nos seus fóruns naturais,
tais como a escola e a comunidade, significa encontrar seus pais, seus
cuidadores, seus médicos e professores. Significa atuar em seu campo promovendo
a informação , a reflexão e a “awareness” de todos que fazem parte dele,
propiciando assim relações mais fluidas e nutritivas.
Tal perspectiva
encontra na própria visão de homem da gestalt-terapia seu fundamento: ao
concebermos o ser humano como um ser contextual, que faz parte de um campo e se
encontra inevitavelmente afetado por ele, acreditamos que ao trabalharmos com e
nesse campo estaremos então proporcionando a possibilidade de emergência de
elementos favoráveis ao desenvolvimento saudável dessa criança.
Ao pensarmos
assim a prática do gestalt-terapeuta com crianças, um campo de possibilidades
se abre diante de nós: o trabalho em escolas, junto às crianças, seus pais e
professores, o trabalho em comunidades junto às crianças, pais e futuros pais,
o trabalho em serviços de saúde junto a gestantes, puérperas e jovens mães, o
trabalho em instituições que abrigam crianças, o trabalho de pesquisa que nos
conduz a novas formas de perceber essa criança e sua relação com o mundo atual,
além do trabalho de psicoterapia que realizamos em nossos consultórios.
Em todo esse
campo de possibilidades encontramos dificuldades, desafios, incertezas e também
inúmeras alegrias e recompensas; levar a Gestalt Terapia para além do
consultório é um compromisso e um desafio nesse momento do meu fazer enquanto
gestalt-terapeuta; questionar, repensar e aperfeiçoar a prática
psicoterapêutica no consultório, partilhando minhas descobertas e experiências,
em cursos, encontros,palestras e aqui no blog, com vocês, é um grande prazer!
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