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25 fevereiro 2011

O brincar na psicoterapia e a ansiedade do psicoterapeuta em "saber" e "entender"



Estamos há dias repetindo que a linguagem predominante da criança é a linguagem lúdica, que é assim que ela estabelecerá uma comunicação com o psicoterapeuta, que crianças vão para psicoterapia PARA BRINCAR.

E, embora pareça obvio que a partir disso o psicoterapeuta também use dessa linguagem para acompanha-la e realizar suas intervenções, tal tarefa, na pratica, mostra-se bem mais desafiadora do que inicialmente se supõe...

Acompanhá-la significa interessar-se genuinamente pela criança e o que ela tem a mostrar, aceitar seus convites, sugestões e pedidos, assinalar com descrições aquilo que ela está mostrando e, principalmente, fazer poucas perguntas.

Muitas perguntas, particularmente em um primeiro momento, podem ser extremamente persecutórias para a criança e não dão espaço para verificarmos o que ela traria se não estivesse sendo “interrogada”. Geralmente, uma profusão de perguntas atende mais às necessidades e ansiedades do psicoterapeuta do que se apresenta como algo para facilitar  o processo da criança.

É fundamental que o psicoterapeuta possa esperar e tolerar o desconforto de um silêncio ou a ansiedade de uma criança que "não sabe o que fazer". Alguns psicoterapeutas, não permitem que a criança tome a iniciativa e preenchem "vazios" com perguntas, sugestões de atividades, técnicas mirabolantes ou longas explicações a respeito do espaço terapêutico. 

Se ele corre para "salvar" a criança da ansiedade e sentimentos ditos "ruins", elimina a possibilidade de observar como ela maneja isso por conta propria e a impede de criar uma possibilidade nova para lidar com a questão.

Da mesma forma, esperar que uma criança fale sobre seus problemas e questões costuma ser algo bastante frustrante...porque ela NÃO FALA ou, quando fala, geralmente reproduz a fala dos adultos...! 

Além disso, a exigencia de que uma criança aja como se fosse um adulto em psicoterapia, gera uma ameaça para o vínculo com o psicoterapeuta, já que pode fazer com que ela sinta-se exigida, pressionada e não aceita em suas possibilidades.

Também é importante ressaltar que o psicoterapeuta não tem que entender o significado daquele brincar, pois isso será apontado pela própria criança em seu processo gradativo de percepção de si. 

A exigência do psicoterapeuta em dar um sentido ás brincadeiras da criança parece estar profundamente enraizada em uma perspectiva interpretativa que perpassa sua graduação e infiltra-se em sua prática, ainda que ele tenha escolhido desenvolvê-la a partir de um paradigma diferente como o da Gestalt-Terapia.

A experiência com a supervisão de gestalt-terapeutas de crianças mostra-nos que essa é uma das principais dificuldades do psicoterapeuta em seu trabalho e a que demanda uma atenção constante de sua parte ao longo do contato com a criança.

O impulso para dar significados ou escolher caminhos que julgamos mais amenos ou satisfatórios para as crianças, particularmente as que nos mobilizam fortes sentimentos de compaixão ou aversão, parece estar sempre presente em nossa prática.

Portanto, é necessário que possamos abrir mão da nossa necessidade de "saber", "entender" e "explicar" e estejamos disponiveis, de fato, para acompanhar a criança, utilizando a sua linguagem predominante e confiando na sua possibilidade de auto-regulação e no poder criador presente em cada uma delas.

3 comentários:

  1. Muito bom o post. Participei de um seminário seu aqui em Fortaleza e desde então venho amadurecendo a ideia de atender crianças. Essa ansiedade de compreender tudo que a criança venha a fazer na psicoterapia é realmente presente e angustiante, deixamos de nos preocupar com o óbvio e essencial, estar junto com a criança e acompanhar seu desenvolvimento...

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  2. Compreendo e concordo com tudo, teoricamente. A ansiedade, ao colocar a mão na massa, consiste em diferenciar o brincar sozinho ou com qualquer pessoa, do brincar realizado em nossos consultórios...

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  3. Muito bom artigo e importante para nós que assumimos esta grande responsabilidade. Estar aberto e disponível, o princìpio fenomenológico, e um aliado na prática clínica. 👏👏👏👏

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